de olhos abertos // ep. 1 - a arte de sentir onde estamos
+ Pinguim, Round 6 e Ilhados Com a Sogra
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Chegou! De Olhos Abertos é a nova revista de cultura e arte do LADO B.
Falando bem a verdade? Esta news é bem especial, já que esse é o assunto ao qual tenho me dedicado nos estudos há muito tempo (afinal, até meus livros falam sobre isso).
E qual é o propósito de tudo que você lerá por aqui? Ajudar seguidores de Jesus a entender e responder à cultura com amor e sabedoria.
Em poucas palavras, é uma newsletter sobre o que eu tenho chamado de sabedoria cultural.
Penso a participação sábia dos cristãos na cultura envolve: contemplar o, conversar com e cuidar do nosso mundo cultural.
NESTA EDIÇÃO 📌
- Uma reflexão sobre como a arte interpreta o nosso tempo
- Comentários sobre as séries Pinguim e Round 6 e sobre o reality Ilhados Com a Sogra.
Pra isso, na primeira estação dessa jornada daremos continuidade a uma série de textos que comecei no ano passando, comentando capítulo a capítulo, o livro Cristianismo Criativo. Além desta uma das principais e mais práticas referências para os cristãos no mundo da arte, Steve Turner é um dos meus grandes heróis quando o assunto é fé e cultura.
Você encontra o livro Cristianismo Criativo lá no site da W4.📗
E olha só, chegou a hora de falar sobre um dos meus capítulos favoritos do livro.
A arte de sentir onde estamos
Os tempos mudam
Quando dei início a esta série, sempre no final do texto eu propunha uma questão colocada pelo próprio Turner. Decidi fazer diferente. Vamos começar com essa pergunta.
Você acredita que os artistas tendem a estar à frente do seu tempo?
De fato, até pelo trabalho de imaginar possibilidades, há um aspecto de antecipação na arte. (Quem nunca viu aquela história de que o seriado Os Simpsons previu eventos específicos? Desde eleições a título da Copa do Mundo)
No entanto, não se trata de uma previsão do tipo “chute no escuro”. Por outro lado. Turner explica que um artista vive o presente tão intensamente que se torna capaz de ver além a partir de onde já estamos. É uma questão de sensibilidade. Artistas têm uma imaginação porosa.
Por isso ouvir é tão importante. Para muitos, fazer arte é falar em diferentes linguagens, fazendo a gente se esquecer que para participar de uma conversa precisamos ouvir com atenção.
É, é bem difícil manter essa virtude num ecossistema inchado de conteúdo e entretenimento, mas a relevância de um artista está mais na qualidade da sua audição do que na rapidez da sua fala.
Se quisermos participar da discussão que acontece no mundo da arte contemporânea, temos de ouvir o que já está sendo dito antes de oferecermos nossa contribuição. […] Se queremos ser relevantes, devemos descobrir o sentido da conversa, os pontos de discórdia do momento e o vocabulário que está sendo usado. (p. 154, 155)
As perguntas que fazemos
Steve cita alguns exemplos de como mudanças na tecnologia, na ciência, na filosofia e no cenário político impactam artistas e seus artefatos. Vamos pensar sobre os avanços tecnológico e nas tensões políticas.
Mudanças tecnológicas afetam pois implicam em novos meios de comunicação (como o progresso da fotografia, por exemplo). Mas esses avanços também podem ser contestados pelos artistas. Precursores da ficção-científica, como William Gibson, há muito exploram os custos do “progresso” técnico-científico. Pense nas histórias que questionam, por exemplo, o poder e os perigos da IA. Já viu Ex Machina?
A quantidade de distopias provam o quanto mudanças políticas provocam (e são provocadas) pela arte. As tensões ideológicas e sociais recentes (e crescentes) nos EUA e no Brasil têm definido a ênfase de obras musicais, produções para TV e na literatura. Aliás, grandes movimentos sociais — seja o dos hippies nos anos 60 ou Black Live Matters, têm na música um tipo âncora. O ambiente político, segundo Steve, pode determinar o sentimento das obras (realistas ou escapistas) e suas pautas (injustiça, pobreza, autoritarismo).
Artistas são questionadores por vocação. Portanto, enquanto mudanças acontecem, as perguntas que a arte faz também se transformam. Na verdade, além da sensibilidade singular, artistas também têm a coragem para questionar, que muitas vezes nos falta.
Além das tendências
Para um discípulo de Jesus no mundo das artes, pode ser tentador tentar escapar da ingenuidade temporal da igreja recorrendo à promessa de ser relevante. Nesse sentido, relevância diz respeito a “falar sobre o que as pessoas estão falando”. Lembre-se: antes, ouça.
É uma motivação justa, que pode, todavia, comprometer o compromisso do artista com a sua própria percepção, criatividade e identidade. Ser relevante não é ser refém das tendências e atualidades. Se adaptar às mudanças da cultura não é o mesmo que absorvê-las acriticamente.
Turner usa o caso de Bob Dylan, que transitou por diversos assuntos em diferentes gerações, para encorajar que artistas sejam sinceros.
Existe uma falta de compromisso e sinceridade nos artistas que seguem uma tendência apenas para dar a impressão da sua relevância. […] Os artistas que, enfim, são respeitados têm uma imaginação suficientemente grande para seguir tendências, mas também para transcendê-las. (p. 165)
Aprendizes de Jesus cumprindo sua missão nas artes precisam sim de sensibilidade ao tempo presente — ouvir e entender o que está acontecendo. Os profetas foram críticos do momento político que viveram, Paulo adaptava seu vocabulário para seus públicos distintos e o próprio Jesus contava histórias que ressoavam na imaginação das pessoas daquele tempo.
Esperançoso, Steve crê que os cristãos podem ser conhecidos na arte pela capacidade de falar com relevância para o presente, questionando, apreciando e confrontando o que acontece hoje. Isso porque a Bíblia oferece uma narrativa maior da história: nos diz de onde vêm e para onde vai a cultura.
Continue pensando
Com tudo isso em mente, ao longo da semana reflita sobre 💭
Pense em uma música que você ouviu, um livro ficcional que você leu e uma série/filme que assistiu. Tente identificar em cada um desses artefatos um assunto que diz algo sobre o nosso tempo (ou revele um aspecto da época em que ele foi criado).
Se você é um artista, liste questões contemporâneas que instigam e provocam a sua imaginação para falar sobre. Ah, importante: você tem ouvido o mundo com atenção e sensibilidade?
Histórias que eu vi por aí
Nesta coluna vou compartilhar insights, análises e reflexões sobre histórias da cultura pop.
Pinguim 🐧
Spin-off do universo de Batman do diretor Matt Reeves, esta trama nos expõe à vulnerabilidade e a brutalidade do protagonista enquanto ele vai dos esgotos ao topo de Gotham.
A meu ver, essa história nos faz pensar bastante sobre amor e poder. Isso porque além de mostrar as estratégias de Oz para derrubar os mafiosos das família Maroni (eu não tenho nada a ver com isso) e Falcone para a assumir o controle de Gotham, a série também revela as relações familiares dele fizeram com que essa trajetória criminosa fosse movida por um senso distorcido de aceitação e aprovação.
Conflitos externos e internos se misturam, gerando uma narrativa que encanta pela complexidade e a tragédia de seu protagonista. A estética noir, focada na sombra das ruas da cidade, também amplia a decadência moral e emocional de Oz. Gostei DEMAIS!
Round 6 💰
Hit da Netflix, essa série chama a atenção por usar a metáfora de um jogo para re-imaginar a competição brutal da nossa cultura capitalista (olha lá, o que acabamos de falar). Basicamente, ela questiona: “Até onde as pessoas vão pelo dinheiro?”. Pertinente! O resultado? Mais uma temporada marcada por atuações convincentes e um design de produção já consagrado. Mas, admito que senti nessa temporada a ambição por inflar a ansiedade do público pelo desfecho da série.
Afinal, a cultura pop critica a sociedade movida pelo dinheiro, mas não deixa de competir nesse jogo, hehe.
Ilhados Com a Sogra 🏝️
É o tipo de programa ótimo pra você se descontrair ou se desesperar — ou os dois ao mesmo tempo. Esse reality confina famílias numa ilha e, por meio de provas e desafios, tenta ajeitar relações familiares disfuncionais. Tragicômico, eu diria. Retrata bem a nossa escassez relacional e como resistimos em curar relacionamentos através da vulnerabilidade, da conversa e do olhar mais de perto.
Espero que tenham gostado da primeira edição da De Olhos Abertos, a revista de cultura e arte do LADO B. Ela volta daqui a duas semanas!
Não se esqueça de me contar o que achou, compartilhar este conteúdo e chamar mais gente pra conhecer o LADO B.
Até logo! ✌🏻
"a relevância de um artista está mais na qualidade da sua audição do que na rapidez da sua fala." Um ótimo ponto.