Tudo muda quando de tudo Cristo é Senhor
Uma jornada com o Cristianismo Criativo, pt. 1
Oi! Que bom te ter aqui no Lado B. Esta é a primeira parte de uma jornada de reflexões a partir da obra de um dos autores que mais moldou minha caminhada como discípulo e transformou meu jeito de olhar para o mundo e para a arte. Cristianismo Criativo, de Steve Turner, está de volta aos catálogos em português. Fique por aqui para descobrir o caminho que Steve nos ajuda a trilhar!
A jornada de Steve Turner, entre a fé e a arte, partiu de um incômodo e foi movida pela busca de sentido. Como tantos outros, ele encontrou em L’Abri nos anos 1970 a sabedoria para deixar de viver um cristianismo pequeno demais.
Sendo poeta e envolvido no jornalismo do meio artístico, Turner se perguntava por que artistas não cristãos estavam à frente dos debates mais decisivos daquela geração enquanto os cristãos cercavam sua arte nas fronteiras seguras de uma subcultura. Do lado de fora fazia-se música de alta qualidade, sensibilidade e percepção. Do lado de dentro, apesar da rica tradição estética do cristianismo, fazia-se o que era útil para as ambições eclesiásticas.
Sim, o incômodo continua. O cenário que Steve descreve de seus anos de formação ainda se repete num evangelicalismo acomodado em suas inseguranças e desacostumado a olhar além — viciado na vida dividida. Mas ele reconhece que este não é um mero problema de irrelevância, “ficar para trás”.
Inclusive, receio que muitas pessoas veem no diálogo com a arte e a cultura popular apenas uma estratégia para tornar a fé mais acessível, atraente e atualizada. E não é nada disso. Assim como Turner, creio que pensar em caminhos para formar discípulos-artistas é um ato de fidelidade. O compromisso devocional, a igreja local e a instrução bíblica são imprescindíveis para esta jornada (mas isto é assunto para os próximos textos).
A falta de cristãos nas artes populares e a qualidade inferior da “arte cristã” contemporânea tiveram um impacto sobre mim quando adolescente. Uma vez que suas alegações foram igno-radas, o Cristianismo parecia ser culturalmente irrelevante. Isso significava que os cristãos não conseguiam fazê-lo prevalecer no mundo "real? Significava que as expressões culturais do Cristianismo somente poderiam sobreviver quando não contestadas, na esfera delimitada da subcultura cristã? (p. 24)
O que nos vicia na vida dividida? Ainda sustentamos uma espiritualidade cristã em hierarquia. Já conheci e convivi com irmãos e irmãs na fé que, com paixão e sinceridade, aguardavam pela oportunidade de deixar seus trabalhos “comuns” para poder “trabalhar para o Reino” integralmente, mesmo que não visando o ministério eclesiástico. Em outras palavras, fazer coisas cristãs. Eu mesmo senti esse conflito. Um anseio de que se eu me afastasse das coisas do mundo estaria mais perto de Deus, deixando de perceber que assim só afasto Deus do meu mundo.
No mundo das artes, esse fechar de portas por parte dos cristãos foi (e ainda tem sido) mais nítido. Evangélicos tendem a desconfiar de artistas não cristãos e do trabalho artístico em si. “Se não quer ser missionário, sem problemas, tente medicina ou administração, mas nem perca tempo com a literatura.” Claro que o desfecho desse discurso costuma ser “isso não dá dinheiro”, mas há desajustes teológicos que exploraremos nas próximas semanas.
Nisso estava o desconforto de Steve Turner que, em dado momento, entendendo o senhorio de Cristo, reconheceu que seu trabalho nas artes e comunicação também servia ao Reino. Essa é a visão que motivou sua jornada na criação literária e no jornalismo musical, vasculhando o que havia de mais inovador em seu tempo. E é também a visão que motivou seu serviço à igreja, despertando e capacitando discípulos a explorar a criatividade e as artes. Um dos frutos desse empenho é justamente o livro Cristianismo Criativo.
Se não estamos presentes nas artes, negamos às pessoas a oportunidade de deparar-se com nossa perspectiva. (p. 37)
Nas próximas semanas (ou quem sabe meses) vamos conversar a partir da conversa que Steve propõe. Vamos refletir sobre a relação da igreja com as artes, as artes no mundo “secular”, a visão dividida por trás do fazer artístico, os recursos bíblicos para re-imaginar a criatividade e assim discernir o nosso tempo e testemunhar com a nossa vida (inteira).
Pra terminar, a cada texto vou deixar aqui uma pergunta que nosso autor-amigo sugere para reflexão:
Como você gostaria que as coisas mudassem para os artistas que são crentes?
Cristianismo Criativo, no Brasil, é publicado pela W4 e você adquiri-lo no site da editora:
Que legal a sua reflexão, Bruno! Já tive esse conflito entre "largar tudo" pra servir o reino. Sobre a pergunta que você propõe no final, acredito que o que deveria mudar é começando por não separar crentes e não crentes. Essa divisão só cria mais divisão. O que vejo hoje são lamparinas debaixo da mesa e sal dentro do saleiro. Os crentes se ajuntam e cantam de si pra si mesmos, numa suposta separação santificada. A igreja é o lugar santo e o mundo do Satanás. Jesus disse ide, e temperem o mundo, salgando, iluminando, independentemente do que você faz, se é cantando ou varrendo a rua.